Fragmentos de um Eu Lírico Perdido
Há tantas metáforas para a vida. Será que as pessoas se
importariam com mais algumas? Às vezes me pego pensando que a vida seja mesmo
como um livro que você se depara com aquela gravura, quando por acaso um vento
bate e levanta páginas aleatoriamente até aquele ponto... Esquecido. Às vezes a
vida parece como quando você está no carro sem pendrive e busca sintonizar alguma rádio
e, por acaso, se depara com aquela música... Há tanto esquecida. É como
naqueles dias nublados em que você vira uma esquina que você não passava há
anos e, de repente, sente várias coisas que nem lembrava que existiam.
Há muitas histórias abaixo das sombras dos postes, a curva
de cada esquina, nos traços de cada porta. É aquela marca de iniciais gravas
com estilete na carteira de uma sala de aula. É aquele diário velho, surrado e
esquecido no fundo de uma gaveta. É aquela sua blusa que você nunca mais via...
Aquela borrada fotografia. São tantas coisas, todas são histórias. Nós somos histórias.
Nós nos esquecemos das histórias, nós esquecemos de nós. Acho que em meio aos
dias e dias do cotidiano eu fui esquecendo de contar histórias e, entre os dias
e dias, eu fui esquecendo de mim. Não fui contando a mim mesmo, não fui tocando
a mim mesmo, fui me perdendo de mim.
Há semanas eu procuro meu eu lírico, aquele das poesias
livres e leves, sonhadoras. De alguma maneira, sinto que eu, eu mesmo, estou
aqui. Em alguma entrelinha deste texto eu posso estar obscurecido pelo cansaço
da madrugada e eu não me sinta tão bem representado, não me reconheça aqui.
Bom, mas o primeiro passo é este aqui: sentar e escrever e reescrever esta
história, este eu lírico perdido, esquecido por aí. Esquecido entre uma velha e
uma nova série de TV, entre uma música nostálgica ou aquela fotografia
envergonhada. Esquecido em algum sorriso ou sorvete de limão que deixei de
tomar. Esquecido nas coisas que eu faço, que me fazem eu, ser eu, eu lírico esquecido,
eu lírico encontrado.